Sequestro de helicóptero está ligado a medo do tráfico de retaliação à morte de meninos em Belford Roxo

Momento da luta a bordo de helicóptero sequestrado

Policiais cumprem mandado de busca em endereço de suspeito/Reprodução

Investigações da Polícia Civil apontam que o sequestro de um helicóptero, em setembro, que seria usado para resgatar criminosos de um presídio foi planejado por medo dos traficantes serem transferidos para presídios federais após a morte de três meninos em Belford Roxo, na Baixada Fluminense. As vítimas desapareceram em dezembro do ano passado.

A Polícia Civil e a Polícia Federal (PF) iniciaram hoje (27) a segunda fase da Operação Águia Sempre, para tentar prender um dos homens que participaram do crime. Agentes da Delegacia de Repressão ao Crime Organizado (Draco) cumpriram mandado de busca e apreensão contra o suspeito de pagar pelos voos de ida e volta de Angra dos Reis. Os policiais cumpriram mandados de busca e apreensão em três endereços relacionados a ele. O nome dele não foi divulgado.

Documentos e equipamentos eletrônicos foram apreendidos e passarão por perícia, para ajudar a comprovar a ligação entre o homem e a facção criminosa Comando Vermelho.

Lucas Matheus, 8 anos; Alexandre da Silva, 10 anos; e Fernando Henrique, 11 anos, desapareceram no dia 27 de dezembro/Reprodução/TV Globo

Chefe do tráfico do Cartelar
De acordo com as investigações, quem mandou matar os meninos foi o chefe do tráfico da comunidade Castelar, Willer Castro da Silva, o Estala. A Polícia Civil afirma que Estala foi morto como queima de arquivo. O mandante da morte dele seria Winton Carlos Rabello Quintanilha, o Abelha, que saiu do Complexo de Gericinó pela porta da frente.

Segundo a polícia, a morte das crianças não agradou os integrantes da facção criminosa, que passaram a temer a mudança para presídios federais e a perda de regalias na cadeia. Para evitar as transferências, a quadrilha planejou o resgate com o helicóptero e pagou mais de R$ 14 mil pelas viagens de ida e volta até um hotel de luxo em Angra dos Reis.

“Na próxima fase, a gente vai tentar identificar de fato quem foram os mandantes desse crime, considerando que esta facção criminosa é muito rígida, muito organizada, e não haveria um resgate daquela maneira se não houvesse, no mínimo, anuência da cúpula desta facção”, afirmou o delegado William Pena Júnior, delegado titular da Draco.

Pará (alto) e Kahwan, suspeitos do sequestro ao helicóptero/Reprodução

Rendido durante o voo
Segundo o piloto Adonis Lopes, uma dupla armada o rendeu em pleno voo e o obrigou a voar até o Presídio Vicente Piragibe, no Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu, para resgatar detentos.
Agentes da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco) foram para um endereço em São Gonçalo a fim de capturar Marco Antônio da Silva, o Pará. Pará, gerente das bocas de fumo do Sabão, em Niterói, e Khawan Eduardo Costa Silva tinham sido identificados na primeira etapa da Águia Sempre como os sequestradores dias depois da ação frustrada.

Quem os bandidos queriam resgatar?

A polícia e a Seap suspeitam de sete detentos. Nas investigações, identificaram “movimentações atípicas” no pátio do Vicente Piragibe naquele 19 de setembro e determinaram a transferência para a segurança máxima de:

Carlos Vinícius Lírio da Silva, o Cabeça do Sabão, apontado como mentor do plano;
Márcio Gomes de Medeiros Roque, o Marcinho do Turano, que seria o alvo do resgate;
Márcio Aurélio Martinez Martelo, o Bolado;
José Benemário de Araújo, o Benemário;
Eliseu Felício de Souza, o Zeu;
Max de Oliveira Nascimento, o Cachorrão;
Bruno Lima Cabral da Silva, o Bruninho.
Onde foi o sequestro?

Pará e Khawan anunciaram o sequestro tão logo decolaram do Frade, um bairro de Angra dos Reis, quando ordenaram que o piloto voasse até Bangu, no Complexo de Presídios de Gericinó.

A polícia ainda não esclareceu totalmente porque os bandidos foram para Angra. Já se sabe que a quadrilha tinha procurado o táxi aéreo para um casal que passaria o domingo (19) em Angra, voltando nesta segunda-feira (20). Quem apareceu para o voo foram os dois homens, e o retorno acabou “antecipado”. É desconhecido se houve contratempos que levaram a dupla a partir para Bangu no mesmo dia.

Os criminosos pagaram cerca de R$ 17 mil em espécie pelo “pacote”: R$ 7.250 pelo voo do Rio até Angra, em torno de R$ 3 mil na hospedagem no bairro do Frade, em Angra, e mais R$ 7.250 pela viagem de volta.

Inicialmente, segundo a polícia, outro piloto tinha sido contratado para a viagem de ida e volta a Angra. Quando a dupla anunciou que queria retornar já, o profissional alegou que não estava se sentindo bem e pediu a Adonis, de quem é amigo, que assumisse a viagem.

O piloto não disse ser policial. Depois de rendido, Adonis apenas tentou demovê-los do resgate. “‘Isso não vai acabar bem, vão atirar no helicóptero’”, disse à dupla. Os criminosos insistiram.

Adonis disse que as manobras sobre um batalhão não foram para chamar a atenção. As imagens do Esquilo desgovernado viralizaram, mas não era um “alerta” do piloto: era, segundo Adonis, uma luta a bordo, com risco iminente de queda.

“Eles pegaram os comandos, o sujeito de trás me deu uma gravata”, lembrou Adonis. “As manobras não foram propositais. Eu pensei que a aeronave fosse colidir com qualquer comando. O helicóptero é muito sensível. Eu a todo momento evitava bater”, descreveu.

Adonis acredita que os criminosos tiveram medo de morrer e decidiram fugir. O helicóptero foi para o Morro do Caramujo, em Niterói, onde a dupla saltou.

Apesar da luta corporal, o policial saiu ileso. Ele contou que, depois que a dupla desceu em Niterói, decolou ainda com a porta da aeronave aberta, com medo de disparos em represália. Na luta, Adonis ainda tentou alertar os sequestradores do risco: “A gente vai cair, larga, solta, a gente vai morrer!”, recordou. “Não sei explicar, eles ficaram muito atônitos”, emendou.